Por razões familiares fui ao Hospital Curry Cabral (Lisboa) visitar um doente que lá estava internado.
Tive algumas emoções a bailar dentro de mim porque foi neste hospital que iniciei a minha actividade profissional.
Mas não é para falar destas emoções que estou a postar.
Na enfermaria em questão, e provavelmente em todo o hospital, havia cartazes sobre os direitos e deveres dos doentes.
Curioso retirei um desdobrável sobre o assunto e li com atenção.
Li os direitos e deveres dos doentes. Voltei a ler. Pensei um pouco, voltei a ler, voltei a pensar e concluí que estamos a viver uma época do politicamente correcto, EM TODA A SUA PLENITUDE!
Vejamos:
Direitos - 12 (doze) - (quatro páginas do desdobrável)
Deveres - 6 (seis) - (meia página do desdobrável)
Para mim deveriam resumir-se a 1 direito e a 1 dever. A saber:
Direito - o doente tem direito a ser tratado no respeito pela dignidade humana. Diz tudo!
Dever - o doente tem o dever de zelar pelo seu estado de saúde. Também diz tudo!
Tudo o resto é paisagem politicamente correcta!
5 comentários:
Não é bem assim...Em matéria de direitos e deveres, o povão e o pessoal da Saúde ainda têm muito que aprender. Dou-te dois exemplos:
1. há quase três anos dei entrada na urgência do Hospital de S. José com sintomas de infecção renal, e apesar de levar uma carta do médico de família com essa indicação, tive de esperar horas no banco de madeira dum corredor. Quando entrei na sala de observação, assisti a parte da conversa da gaja que tinha sido atendida antes de mim: queixava-se duma dorzita muscular nas costas e queria continuar a empalear com a "suspeita de cera num ouvido". Cheguei a pensar que era delírio meu, da febre que me ia subindo e me dava tremuras incontroláveis!
Mas a criatura não deve ter aprendido nada ali, porque ninguém a mandou firmemente embora, queixar-se de dores de costas e cera nos ouvidos ao médico de família, não ao médico da urgência...
2. a minha experiência de internamento hospitalar, e até de simples consultas médicas, ensinou-me que grande parte do pessoal da Saúde, com raras e honrosas excepções, tem uma terrível tendência para achar que o paciente é ignorante e não tem o direito de opinar sobre si próprio e sobre as terapêuticas e tratamentos que lhe querem aplicar; outra ainda mais catastrófica é a de acharem que a dor é pieguice ou é para se sofrer em silêncio. Às vezes este desatenção pela dor dos outros, seja real ou imaginada, dá tristes resultados, como sabes...
Não sei se a informação que viste está bem ou mal feita, mas os princípios abrangentes que enuncias, de tão gerais e abstractos, não têm substância na prática. A gente lê e diz "está muito bem", mas depois em que é que eles se traduzem?!
E essa do "politicamente correcto"...Usa-se tanto, a torto e a direito, que estou em crer que o PC, hoje, é usado sobretudo pelos que se acham chiques por se sentirem "politicamente incorrectos". Não é o teu caso, evidentemente, mas modera o uso da expressão.
Pois é, o doente deve ser tratado com toda a dignidade humana!
As duas situações enquadram-se nesta permissa.
Com o post não quis dizer que os profissionais da saúde não precisem de reflectir sobre a sua prática.
Fazendo proclamações "lindas" e a prática manter-se inalterada é que está errado!
É contra esta prática anti ou para-dignidade humana que protesto.
Claro que há, felizmente, muitíssimas excepções, conheço profissionais de saude competentes e cheios de dignidade e humanismo na forma como cuidam dos doentes.
Estou à vontade para falar uma vez que estou definitivamente sem actividade clínica.
No fundo estamos de acordo!
Para que os direitos sejam mais do que palavras num qualquer documento, é indispensável que se apresentem devidamente discriminados de forma a que a reivindicação da sua própria efectivação seja reconhecida e garantida,inclusive pelos agentes do próprio estado ou dos privados.E não só na saúde!
Tens razão, Manel. Por isso é que acho que estou em desacordo com o DO: se apenas se enunciam princípios tão gerais, poucos serão os que lhes conseguirão dar conteúdo real e concreto.
Teresa e Manel:
Sei o que vocês pensam e estou de acordo.
O que quero dizer é que os direitos estão mais ou menos consignados na lei e nos códigos deontológicos e outros.
O que que nunca pode ser regulamentada é a relação humanizada, o cuidar da pessoa, a assunção real da dignidade humana.
Podes ter o último grito da tecnologia, o mais sofisticado dos hospitais e os técnicos nem o teu nome saberem.
O que eu sempre quis é que os profissionais de saúde soubessem que tu és o Manel, com este e aquele problema pessoal e familiar, mas que foste internado para tratar a pneumonia.
Cuidar de pessoas e não de doenças, com toda a dignidade que a condição humana impõem.
É isto.
Como vêm estamos todos de acordo.
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